Você
já deve ter ouvido a frase “doe órgãos, doe vida”, que é na verdade um
apelativo à consciência da população quanto a esse problema tão preocupante. O
Brasil tem fama de ser um país caridoso, já que se pede tanto por aqui, seja na
TV, rádio, nas ruas, ônibus ou mesmo no horário político. Porém, enquanto lembramos-nos
de ajudar as pessoas dando a elas dinheiro, ignoramos pessoas ainda mais necessitadas
que precisam e pedem apenas para viver. Deixar claro em vida que deseja ter
órgãos seus doados nem sempre é o suficiente para que essa ação se concretize.
Isso porque a família também precisa autorizar a retirada dos órgãos logo
depois que a morte encefálica (quando o cérebro cessa suas atividades elétrica
e química, ocorrendo morte cerebral) for diagnosticada. Muitas famílias, no
entanto não autorizam a doação por conta da complexidade do momento, da dor que
estão sentindo (muitas vezes se esquivando de qualquer possibilidade de
diálogo), medo de que esses órgãos não tenham o destino prometido, não
aceitação da separação entre corpo e alma, onde entram também fatores
religiosos e culturais. Portanto a não doação de órgão é uma questão complexa e
multifatorial, não necessariamente um ato de desamor.
A não
compreensão do que seja realmente a morte encefálica está entre os principais,
se não o principal obstáculo. As pessoas se recusam a admitir que seu parente morreu enquanto o coração ainda estiver batendo, quando na
verdade este baterá apenas por mais algumas horas devido a sua não total
dependência do cérebro para funcionar, o que possibilita apenas a manutenção de alguns órgãos por mais algum tempo, mas a vida já se foi. O coração possui células auto-rítmicas
que iniciam um impulso nervoso pelo músculo cardíaco contraindo as células do
miocárdio, isso quase sem nenhuma interferência do encefálica, que funciona apenas
como um regulador da frequência e força de contração através da ação do nervo
vago. Todos já devem ter ouvido falar de um caso de acidente automobilístico
onde fatalmente o coração ficou fora do corpo e ainda assim batia. Agora já
sabem por que isso acontece. Pois bem, se a mídia de forma geral destinasse um
pouco do seu espaço, ainda que fosse o já concedido atualmente, para explicar
melhor à população o que é a morte encefálica, menos gente morreria na fila de
espera e não precisaríamos cogitar a possibilidade de doação de órgãos em casos
onde não há morte cerebral, como no caso de pessoas em estado vegetativo. Se isso acontecesse, abriríamos as portas
para entrarmos numa nova realidade onde mais pessoas aceitariam doar não apenas
por que já precisaram ou por que já viram o sofrimento e angústia de que
espera, mas sim porque a benevolência humana prevalece e o próprio conceito do
que é caridade foi ampliado.
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